SER FELIZ OU TER RAZÃO?
O trabalho e artigos de Christian Ingo Lenz Dunker (Psicanalista Professor Livre Docente Departamento de Psicologia Clinica Instituto de Psicologia da USP, e como professor do Mestrado em Psicologia da Universidade São Marcos, participa da Linha de Pesquisa Constituição do sujeito na família e na clínica) sempre me impressionaram desde que li “A praga de Kafka” e “11 de Setembro: o império da angústia”. Suas reflexões aproximam a Psicanálise a temas como guerras e o homem contemporâneo, além de convidar o leitor a inúmeros questionamentos sobre suas relações pessoais.
FONTE: REVISTA MENTE E CÉREBRO, ANO XIX, Nº 229,PÁG. 15Assim sendo, acredito que o presente artigo: “TER RAZÃO OU SER FELIZ”, irá colaborar para refletirmos com um novo olhar sobre relacionamentos conjugais. “O fundamentalismo conjugal pode transformar casamentos emverdadeiros campos de terrorismo – e o outro, a quem julgávamos amar, passa a ser um inimigo. Em matéria de casamento, há adeptos de duas formas de fundamentalismo: existem os que sofrem com o sentimento de injustiça e os que padecem da supressão da liberdade. Geralmente a sobrevivência de um casal depende da equitativa distribuição dessas crenças sobre a origem da infelicidade. Fundamentalistas são aqueles se agarram a um tipo inabalável de convicção particular e “praticam” essa crença, buscando eliminar, por meios violentos, opiniões diversas das suas, o que influi diretamente na relação com as outras pessoas. Os fundamentalistas tendem a acreditar que exite um – e apenas um – valor maior e que este não deve se misturar ou se confundir com práticas de sentimentos. Por meio violento pode-se entender: extorsão e chantagem, campanhas d desmoralização, indiferença calculada, greve de sexo, coerção corporal, silêncio opositivo, traição ou sevícias verbais. Todo fundamentalista imporá ao outro, cedo ou tarde, a seguinte questão: “O que você prefere: ter razão ou ser feliz?” Antes disso há o longo processo que Freud chamou de “a mais geral degradação do objeto da vida amorosa”. Ou seja, a linda mulher transforma-se no dragão que solta fogo pelas ventas, enquanto o homem volta à companhia anestésica dos amigos no bar. Nesse contexto, os filhos surgem como figuras de consolação, uma referência remota ao que um dia teria sido um grande amor. Os cônjuges sentem-se injustiçados e bem menos livres do que esperavam. Começam então as ações terroristas que sempre emanam do fundamentalismo: a injustiçada vinga-se do marido culpado, que renunciou à liberdade de seu próprio desejo. O culpado oprime a mulher com sua própria covardia. A covarde vinga-se impondo a injustiça recebida do marido ressentido, que trai em nome da injustiça contra a liberdade feminina; liberdade essa que a ciumenta controla desmedidamente no marido que ela inveja. E o invejoso tenta destruir a indolência libertária de sua esposa consumista. É a luta dos que têm os meios e as posses contra os que possuem os recursos e o trabalho. Quem ama mais contra quem cede mais. A equação não fecha. “O que não significa que as aspirações de justiça e liberdade sejam menos legítimas só porque acontecem no espaço privado da vida conjugal, ou porque não se ofereçam na forma de um acordo simples e pactuado.” O antropílogo francês Claude Lévi-Strauss (1908-2008), que esteve no Brasil na década de 30, oferece-nos um modelo lógico do problema. Duas tribos se enfrentam desde tempos imemoriais pelo controle de um espaço comum. O etnólogo disposto a esclarecer as razões da contenda pede que o primeiro grupo faça um mapa do que está em disputa, recebendo uma descrição razoável do problema: os da tribo A estão no centro, e os da tribo B estão na periferia. A interpretação dos As é que os Bs estão querendo invadir a região central, que pertence, por direito, aos membros da tribo A. Mas quando o pesquisador pede um mapa equivalente ao grupo B, recebe uma mensagem diferente. O território da tribo B aparece “em cima”, enquanto o da tribo A se encontra na desfavorável localização “embaixo”- daí que eles estejam sempre querendo invadir a cota superior, que pertenceria, por direito, à tribo B. Portanto, o problema do fundamentalismo conjugal não e´que existam várias formas de praticar e conceber a justiça ou a liberdade, mas que, necessariamente, por razões de estrutura do espaço, a justiça de um não pode ser perfeitamente trocada pela liberdade do outro. Talvez a crença na justiça seja diferente da crença na liberdade. Acordos locais podem ser feitos, dentro do espírito freudiano de precariedade das relações conjugais, mas um verdadeiro fundamentalista vai sempre querer impor a idéia de que há apenas um mapa possível na situação – e que entre liberdade ou justiça há uma única forma de acreditar na felicidade conjugal. Christian Ingo Lenz Dunker Lilian Nakhle Neuropedagoga/Psicopedagoga Contato: 9645.4466 LilianNakhle
Enviado por LilianNakhle em 27/02/2012
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